quarta-feira, 21 de novembro de 2012

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eu menti pros meus poemas. enganei o rimbaud, meu professor de geografia e meu melhor amigo. troquei o utópico pelo contra-cheque que garanta um quarto-sala em bairro classe média e pizza aos sábados. nada dos sonetos. a rima rica perdeu espaço para a prosa dura, seca. agora é tarde, a maratona tá no meio e não dá pra desistir. a gente continua, mas sempre pensando em desistir, sempre achando que ali na esquina vai chegar. assistindo o cachorro ficar velho, a planta morrer, o sonho quietar.

vendemos a alma ao diabo, mas a recompensa valeu o que? escuto um choro no chuveiro implorando por um final de semana de ócio. lembra a gente deitado na grama, formiga subindo pelo braço e a coceira nas costas? não volta. e nem sei mais se queria que voltasse. mas lembrar do conhaque, da discussão do futebol e só poder sorrir, porque rir já não dá mais, faz com que eu peça desculpas a todos meus santos alcoólicos  se faz necessário aprender a desistir também.

domingo, 27 de maio de 2012

sementes


E ai que esse texto vem num domingo cheio de espaços no tempo, onde são 17h43 e eu ainda nem almocei, engolido aqui no sofá pra ver se a fome aumenta minha inspiração e me deixa assim, meio bêbado sensível. E meio que ele vem alguns dias atrasado, uns oito, pra ser mais preciso. Uns 10 anos, pra ser mais sincero. E meu bem, eu juro que tenho tentado. Eu juro que prometo não prometer nada se você prometer que nessas nossas brigas bobas você só vai me amar mais. Eu cheguei atrasado, eu sei. Tá, uns 10 anos. Tudo bem, é bastante, mas eu tô tentando, eu juro. E vou conseguir, se derrubar uma lágrima cor de tempestade dos teus olhos lindos e do teu peito de aço. Deixa tocar os Stones, deixa eu ser teu Alain Delon de mentira. Nosso cordel só começou e tem tempo. Tô comprando ele a prazo e pago quando cair aquele dinheirinho.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

quando os filtros importam menos

Quando a campainha tocou sem ninguém ter sido anunciado no interfone, já matei na hora. Chegaram. E mal chegaram, já se espantaram com a geladeira vazia. Umas latas de cerveja, um pote de mostarda e umas fatias de presunto. A primeira resolução já tava tomada: uma ida ao mercado com direito a jogar o danone no carrinho sem nem ver o preço. Em alguns momentos fui guia. Peguei na mão dela pra atravessar o bloco de rua, como quando tinha uns sete anos e a proteção vinha do sentido contrário. Ri com os bêbados e embebedei os sóbrios. Bebemos como amigos, de uma maneira que poucas vezes havíamos feito.

Mostrei, orgulhoso, a casa com a luz da sala queimada, os posteres meio tortos, a janela sem cortina e o box que não fecha. Arrastei o s só parar irritar o velho. Fiz a dupla 'trânsito paulistano' andar de ônibus e bater papo com taxista. Desmaiaram cansados e roncando o velho ronco que antes atravessava dois quartos, e agora, na caixa de fósforo da rua Senador Vergueiro, no bairro do Flamengo, parecia ainda mais ensurdecedor com a parede fina separando o quarto-salaetodoresto. Ai eu puxo a cadeira, pergunto da fulana, da família, da cidade. Tento dar o sorriso mais sincero que a foto pede, como os presentes que não pude dar.

Na despedida, dou uma tossida forte, meio que disfarçando os olhos um pouco marejados. Era domingo e só poderia sê-lo. O dia cinza das despedidas. Despedidas só acontecem aos domingos. Mesmo quando o calendário teimosamente insiste em dizer que é sexta ou quarta. Voltei sozinho para o calor dos 20 e poucos metros quadrados, sem saber muito bem porquê não tinha entrado também naquele táxi que seguia em direção ao aeroporto. É a pergunta que me faço mais ou menos a cada quatro ou cinco dias, entre duas e três da madrugada. As coisas andam meio corridas por aqui, deixo pra buscar resposta numa outra hora. Diz que amanhã dá praia.